Friday, August 26, 2005

..isto que sinto.

Tortura
"Tirar dentro do peito a Emoção,
A lúcida verdade, o Sentimento!
-- E ser, depois de vir do coração,
Um punhado de cinza esparso ao vento!...
Sonhar um verso de alto pensamento,
E puro como um ritmo de oração!
-- E ser, depois de vir do coração,
O pó, o nada, o sonho dum momento...
São assim ocos, rudes, os meus versos:
Rimas perdidas, vendavais dispersos,
Com que eu iludo os outros, com que minto!
Quem me dera encontrar o verso puro,
O verso altivo e forte, estranho e duro,
Que dissesse, a chorar, isto que sinto!! "
Florbela Espanca

Às vezes as emoções perdem-se num turbilhão de ideias e gestos, palavras que gritam mudas e se perdem na propagação do som.

Às vezes é impossível dizer o que sentimos e essa impossibilidade traduz-se das mais variadas maneiras.

Sentimentos que caíem dentro de nós e se afundam... às vezes nas lágrimas que os traduzem.

Quisera eu, saber sempre o que sinto e como o sinto, com que intensidade e de que maneira, como dizê-lo ao mundo e como guardá-lo só em mim.

... isto que sinto, ninguém sabe ao certo o que é...

Nem eu.


Menina feita Mulher...



Estavas sozinha, no escuro do quarto.
No meio da escuridão que te envolvia, entre as quatro paredes silenciosas que te rodeavam, ouviu-se um burburinho.
Tu e essa menina que trazes dentro de ti começaram a falar…
O vosso objectivo? Entender o mundo…
Essa menina que trazes aí dentro queria saborear as cores…
Perceber o significado de todas as coisas.
O porquê do céu ser azul…do mar ser salgado…
O porquê dos dias e das noites…
Tudo!
E a mulher que tu também transportavas, mostrava-lhe tudo, explicando todos os pormenores.
Só que as dúvidas foram aumentando…
Ela não entendia a perda da inocência, nem a malícia que cada vez mais invade o mundo.
Ela não entendia a guerra, nem a pobreza.
E as respostas para tudo isso iam escasseando…a mulher que trazes aí dentro não as encontrava.
Até que a tua faceta de menina te perguntou:
“Porque choras tu?”
A respiração parou e o ar tornou-se pesado…
Tu não conseguias dar resposta a isso.
Tentas mostrar-lhe que a essa coisa a que chamam vida por vezes não é sempre cor-de-rosa.
A menina fingiu que acreditou.
Até que uma nova pergunta surgiu:
“Isso de chorar faz parte da vida? Dos dias menos bons que ela traz?”
"Chorar é um sentimento digno. Algo que não devemos oprimir nem esconder. Por vezes sabe bem…ficamos aliviados, como se tirassem um peso de cima de nós, sabes?"
“Mas quando choras ficas com cara feia! Cara triste! Não gosto de me ver assim. E já agora…de que são feitos os sentimentos? De algo doce ou amargo? Com cores vivas ou não?”
Tu, mulher, prometeste que ias evitar chorar. E disseste que os sentimentos são algo de difícil explicação. São como que “coisas” que existem dentro de nós. Uns fazem-nos sentir felizes, outros tristes.
A menina, então, diz: “Ah! Aquelas coisas que por vezes nos fazem sentir um arrepio na pele, umas borboletas na barriga e outras que fazem a água salgada cair dos nossos olhos…chorar?”
"Sim, é mesmo isso."
“Então e de que são feitos os sonhos? De alguma massa especial? Pelo menos acho que são coisas que te deixam feliz.”
"Claro que deixam…é tudo o que gostaríamos de alcançar. Como quando tu reinavas neste mundo e querias ser professora ou actriz, lembras-te? Com o passar dos anos tudo isso mudou, mas a sua essência é a mesma e o seu objectivo último também. È ser feliz, e mostrar ao mundo o nosso sorriso. É querer chegar ao céu, tocar nas estrelas, deitarmo-nos na lua a ver o Sol.
É viver a vida à nossa maneira, dando os passos certos para os alcançar. Sem ter medo de cair, mas de pé atrás para que a queda não seja demasiado grande."

A derradeira pergunta deixou-te pálida:
“Agora que percebo de cores, de um pouco do mundo, de amálgamas de sentimentos, de confusões de emoções e do que são feitos os sonhos, diz-me o que é o tempo e o que é a vida?”
E agora? O que é que a mulher que és tu lhe pode dizer?
"O tempo é feito de tudo e de nada. Por vezes corre…tanto que nem dás por ele, outras passa tão lentamente ou parece mesmo que não passa. Umas vezes parece que se esfuma no ar, outras parece tão concentrado e demorado…uma eternidade, algo sem fim.
A vida, não sei explicar. Só a podes entender vivendo. Tem dias bons, outros maus. Cores vivas e outras não. È feita de sonhos. Misturam-se sentimentos, emoções, confusões. Caminhos que se tem de percorrer, escolhas por fazer. Tantas são as vezes que erramos, acabando sempre por aprender qualquer coisa nova. Barreiras que temos de saltar, muros que temos de partir para continuar o nosso caminho. Tanto que temos para saber, esperando sempre ter tempo para tudo e para mais alguma coisa. A vida é tudo e mais alguma coisa.
A vida é para ser vivida a cada segundo. Momento a momento fazendo destes coisas únicas e especiais. Por vezes apetece-nos fugir dela, apagar momentos, recomeçá-la e fazer tudo de maneira diferente. Mas a vida é só uma e a nós só nos resta aproveitá-la…mas é tão fácil falar, quando não sabemos ao certo o que queremos ou como devemos fazer as coisas. Como nos devemos comportar. Ou se estamos a aproveitar a vida, a fazer as coisas certas."
“Achas que algum dia o vamos saber? Algum dia vamos entender esta coisa a que chamam vida?”
"Acho que não…"

Wednesday, August 24, 2005

Perdi noção do tempo.
Perdi noção do tempo que passei em pé, em frente da parede húmida, áspera e decadente.
No escuro encarei a parede que nunca vira, mas que sabia estar lá, podia tocar-lhe, sentir-lhe o cheiro a mofo… até na boca.
A princípio julguei que ouvia o silêncio, a princípio só ouvia o silêncio, mais tarde, de tanto fitar a parede comecei por ouvir aquilo que não eram mais que palavras soltas, mais tarde frases e com o passar do tempo as conversas tornavam aquele lugar ensurdecedor, quase que me levaram à loucura quando finalmente entendi que aquelas vozes estavam todas em mim . Não vinham da parede, não existiam ao meu redor, eram ideias que tinham nascido, existiam por eu estar ali, frente à parede nua.
Com o tempo também aprendi a controlar as vozes.
Com o tempo deixei de sentir o meu corpo, primeiro as pernas, depois os braços e por fim todo o corpo, deixei de saber se era eu quem esperava ali, inerte, a queda da parede.
Com o tempo perdi a noção do tempo e no tempo perdido eu já não me sabia encontrar.
Das vozes ensurdecedoras só já existia um murmúrio, dizia baixinho, como que com medo da oponente parede, que ninguém chagaria para a derrubar, que o tempo continuaria a passar e eu ali ficaria, inerte, à espera.
O que era um murmúrio transformou-se numa ladainha e, de novo, quase enlouqueci.
Certa vez, numa dessas vezes em que quase enlouquecia, senti uma picada, no escuro não soube dizer o que tinha sido, se animal ou coisa me tinha atingido, sei que essa picada salvou meu corpo que dormia há muito e gritei de dor.
Com esse grito a parede abriu uma pequena fenda, que eu não vi porque estava escuro mas senti na solidez da parede. Ao aperceber-se deste fenómeno a ladainha cessou.
Tudo ficou calmo por um instante que eu não sei se foi curto ou comprido porque não sabia mais que tempo era. Esse instante foi como o fechar dum ciclo. A voz que outrora me enlouquecera, dizia-me agora que era possível deitar abaixo a parede, a inércia a que me haviam condenado estava prestes a acabar.. talvez se eu gritasse mais um pouco…
A princípio duvidei, como seria possível?
Porém, antes que o ciclo que se iniciasse me levasse de novo a fitar a parede, dei um passo em frente ( quase bati na parede), estendi a mão e senti, de novo, no escuro a fenda, rodeei-a com as mãos, encostei os lábios às mãos e um som tímido, quase inaudível fez frente à imponente parede. Perdi a noção ao tempo que este som levou a tomar forma de grito, o tempo que demorou a embrenhar-se na fenda da parede, o tempo que levou a encontrar um caminho até ao outro lado, a difundir-se, a alastrar-se a todas as fundações da esmagadora parede.
Perdi o tempo ao tempo que gritei, até que por fim, um grito que outrora fora surdo, dividiu a parede em mil bocados e, em tempo nenhum a parede caiu e um luz imensa encheu a divisão.
Foi-me difícil abrir os olhos ao principio, mas pouco tempo depois habituaram-se à claridade e pude finalmente ver do que a parede me separava.
Abri mais os olhos de espanto.
De costas para a parede derrubada fitei, esmagada pela crueldade das evidências, que outra parede me fitava, intacta, forte e áspera como a que derrubara.
Perdi noção do tempo que me permiti a olhá-la, de pé, parada, até sentir o torpor a que o meu corpo se subjugava, até ouvir nada mais que silêncio.
Perdi noção do tempo e deixei-me ficar.

Há sempre mais paredes a derrubar.

Tuesday, August 23, 2005

With our own two hands...


I can change the world
With my own two hands
Make a better place
With my own two hands
Make a kinder place
With my own two hands
I can make peace on earth
With my own two hands
I can clean up the earth
With my own two hands
I can reach out to you
With my own two hands
I’m gonna make it a brighter place

I’m gonna make it a safer place
I’m gonna help the human race
With my own two hands
I can hold you
With my own two hands
I can comfort you
With my own two hands
But you got to use
Use your own two hands
With our own
With our own two hands

(Ben Harper)

Nas tuas mãos...


..::As mãos::..

Com mãos se faz a paz se faz a guerra.
Com mãos tudo se faz e se desfaz.
Com mãos se faz o poema – e são de terra.
Com mãos se faz a guerra – e são a paz.

Com mãos se rasga o mar. Com mãos se lavra.
Não são de pedras estas casas mas
de mãos. E estão no fruto e na palavra
as mãos que são o canto e são as armas.

E cravam-se no Tempo como farpas
as mãos que vês nas coisas transformadas.
Folhas que vão no vento: verdes harpas.

De mãos é cada flor cada cidade.
Ninguém pode vencer estas espadas:
nas tuas mãos começa a liberdade.



Manuel Alegre.

Thursday, August 18, 2005

Pedaços


Olhas para ti e não consegues entender ao certo o que vês.
Prevês uma mudança… de sentimentos, de postura, de tudo.
Por mais que a busques não a alcanças.
Tentas viver assim.
Conhecer cada pedaço teu.
Cada lágrima, cada sorriso, cada olhar, cada gesto.
Sabes que apenas te tens a ti, apesar do meio mundo que te rodeia.
Só tu podes crescer, aprender, viver, mudar, lutar.
Só tu podes ser tudo o que quiseres…nunca ninguém o será por ti.
Só tu podes gostar, amar, desejar, querer alguém.
Ninguém o alcançará por ti.
Por vezes perdes a força, o sorriso desfaz-se, as lágrimas caem…
Os sonhos desvanecem-se como a poeira na leve brisa…
E aí tu voltas a cair
E aí tu voltas a contar apenas contigo na busca do novo dia, de um novo sol.
Mas também aí perdes a vontade de lutar ou de sofrer de novo.
Não entendes o porquê de valer a pena tudo isso.
Nesses momentos tu sentes-te perdida no mundo, perdida em ti.
Sozinha no meio da rua nua, crua e bruta...por entre a chuva que caí sem cessar. Que te molha...a ti...à tua alma...aos teus pedaços.
Mas quando as nuvens cinzentas partem, e a massa de que são feitos os sonhos se recompõem, tu renasces.
Leva tempo, muito tempo…tanto que não sabes quando tudo isto vai acabar.
Mas nesse tempo pegas em todos os teus pedaços
Nas tuas lágrimas perdidas, nos sorrisos forçados, nos olhares e nos gestos e segues em frente.
Sabes e sentes dentro de ti que um dia vai ser assim…que um dia vais passar a acreditar mais em ti.
Sabes e sentes dentro de ti que uma mudança é possível.
Sabes e sentes dentro de ti que crescer é viver.
Sabes e sentes dentro de ti que desistir sem lutar é deixar que a vida nos viva…nos vença.
Sabes e sentes dentro de ti que o silêncio calmo e escuro te magoam, mas também te acalmam…contudo esse silêncio passou a ser ensurdecedor.
Sabes e sentes dentro de ti que muitos mais muros se irão impor à tua frente…prontos para derrubar essa pessoa frágil que aí está e que cairá como uma folha que voa no vento.
E no fim, sabes e sentes dentro de ti…ou gostarias de saber e sentir que conseguirás dar os passos certos, lutar contra tudo e todos…e gritar um dia aos sete ventos…
Valeu a pena acreditar,
Sonhar,
Viver,
Reviver,
Renascer,
Abrir os olhos, ver, ouvir e sentir,
Que valeu a pena ser assim…tal como tu és.
Pedaços que se conjugam, mesmo estando em dias perdidos nos quatro cantos desse teu mundo, que um dia também gostarias de conhecer, entender, mudar e alcançar.

How I wish I could surrender my soul;
Shed the clothes that become my skin;
...
How I wish I had screamed out loud,
Instead I've found no meaning.
I guess it's time I run far, far away; find comfort in pain,
All pleasure's the same: it just keeps me from trouble.
Hides my true shape...
How I wish I could walk through the doors of my mind;
Hold memory close at hand,
Help me understand the years.
How I wish I would save my soul.
(James Blunt)

Isn't very difficult to see why you are the way you are.
Doesn't take a genius to realise that sometimes life is hard.
It's gonna take time but you'll just have to wait.
You're gonna be fine
I don't wanna hear you tell yourself that these feeling are in the past.
No, it doesn't mean they're off the shelf because pain is built to last.
Everybody sails alone
Don't hold on,but don't let go,
I know it's so hard. You've got to try to trust yourself.
I know it's so hard
(Kt Tunstall)

Como podes te entregar?
Sabendo que nem foste tu o incapacitado de pensar, de criar, uma nova doutrina para o resto idealizar.
Um conjunto de ideias curtas fáceis de memorizar.
Outro dogma, outra ideologia que é fraca para criar...Procriar outro conjunto de iguais para fazer como tu fazes...Como te ensinaram a pensar, e aceitar, sem tentar compreender,sem ver que não é bem assim, que tu não podes viver bem assim...
(Primitive Reason)

Monday, August 15, 2005

Pode?


PODE ALGUÉM SER QUEM NÃO É


-Senhora de preto
diga o que lhe doi
é dor ou saudade
que o peito lhe rói
o que tem, o que foi
o que doi no peito?
-É que o meu homem partiu
Disse-me na praia
frente ao paredão
“tira a tua saia
dá-me a tua mão
o teu corpo, o teu mar
teu andar, teu passo
que vai sobre as ondas, vem”

Pode alguém ser quem não é?
Pode alguém ser quem não é?
Pode alguém ser quem não é?

Seja um bom agoiro
ou seja um mau presságio
sonhei com o choro
de alguém num naufrágio
não tenho confiança
já cansa este esperar
por uma carta em vão
“por cá me governo”
escreveu-me então
“aqui é quase Inverno
aí quase Verão
mês d’Abril, águas mil
no Brasil também tem
noites de S. João e mar”

Pode alguém ser quem não é…

É estranho no ventre
ser de outro lugar
e tão confusamento
ver desmoronar
um a um sonhos vãos
duas mãos
passando da alegria ao desamor

Pode alguém ser livre
se outro alguém não o é
a algema dum outro
serve-me no pé
nas duas mãos,
sonhos vãos,
pesadelos diz-me:

pode alguém ser quem não é?

Sérgio Godinho

Tuesday, August 02, 2005

Through the dark




As I walk away
I look over my shoulder
To see what im leaving behind
Pieces of a puzzle
And wishes on eyelashes fade
Ohhhh how do I show all the love
Inside my heart
This is on you
As im felling my way
Through the dark
I and I use to talk
With honest conviction
With how I predicted my world
Im going to leave it to star gazes
To tell me what your telescope says
Ohhhh what is in store for me now? It’s coming by and I know that’s its true Coz im felling my way through the dark
Try to find light on someway
Try to find light on somewhere
Im finding im falling in love with the dark all over again
Ohhhh what do I know
I don’t care were I start
And troubles are few as im feeling my way through the dark
Through the dark
Feeling my way through the dark

(Kt Tunstall)